quinta-feira, 26 de dezembro de 2024

Prof. Antônio Marcos: "Brasil, de modelo escravista à sociedade capitalista dependente" (#927)

BRASIL, DE MODELO ESCRAVISTA À SOCIEDADE CAPITALISTA DEPENDENTE: COMO SUPERAR ESSES DESAFIOS?


Antônio Marcos Quaresma Ferreira (foto: arquivo do autor)

Academia Igarapemiriense de Letras (AIL)

Professor e Escritor. Mestre, Especialista e Graduado. Filósofo.

Vereador em Igarapé-Miri (PA), pelo Partido dos Trabalhadores(as)

 

A história social do Brasil desde seu início foi marcada pela diferença de classes, onde de um lado estiveram os dominadores e de outro os dominados. Foi assim desde a colonização, passando pelo período de escravidão, até a estruturação e consolidação da sociedade capitalista atual.  Foi nesse território de desigualdade que o país viu emergir uma nova categoria de classe totalmente à margem de da dignidade social, isto é, pessoas tratadas como “subgente”, obrigadas sobreviver de atividades informais e eventuais. Souza (2009) classifica esse seguimento como a “ralé da sociedade”.

Autores como Florestan Fernandes (1920-1995), Paul Singer (1932- 2018) e Darcy Ribeiro (1922-1997) destacam a escravidão como elemento importante para a compreensão da desigualdade social brasileira e descrevem a transição do modelo brasileiro de sociedade escravista à sociedade capitalista (dependente).

Darcy Ribeiro (1995), ao discutir essa questão da estratificação social no Brasil constrói um organograma que permite compreender a sociedade brasileira dividida em classes: dominantes (constituídas por: patronato- representado pelo setor oligárquico “senhorial parasitário” e 2) patriciado - empresarial contratista), setor intermediário (esses constituem-se de: autônomos - profissionais liberais e pequenos empresários e dependentes –funcionários e empregados), classes subalternas (estas, segundo o diagrama de Ribeiro, são constituídas de campesinato - assalariados rurais, parceiros e minifundistas e operariado (fabril e serviços) e Por fim, as classes oprimidas que para ele são constituídas de pessoas que vivem totalmente à margem da sociedade (marginais) a exemplo de: trabalhadores estacionais, recoletores (volantes), empregados domésticos, biscateiros (delinquentes) prostitutas/mendigos.

Esse diagrama de distribuição da sociedade brasileira em classes pode ser muito bem compreendido a partir da rememoração do início da colonização portuguesa (onde tínhamos uma estrutura de “não mercado de trabalho”), passando para o momento específico do modelo de produção escravista, até a transição para modelo de trabalho livre (que substituía o negro escravizado/africano pela mão de obra imigrante). Vale citar que à margem da modernização da produção, promovida pela revolução industrial, ocorrera à formação de um imenso cadastro de reserva formado por negros, imigrantes, ex-escravizados, caipiras, quais serão “descartados” pelo sistema.

A questão da estratificação social é amplamente discutida por Paul Singer (1981), em uma tentativa do autor em medir o tamanho das classes, assim como analisar as transformações estruturais durante o período de 1960 a 1976. Para o autor, “as classes são os verdadeiros atores no drama que se desenrola no convívio história” (Singer, 1981). Nesse sentido as classes sociais seriam as grandes responsáveis pelos embates sociais organizando-se em correntes de opinião, alinhamento ideológico, formação de partidos políticos, dentre outros, embora nem sempre apareçam em cena, elas seriam as protagonistas da história e vinculariam suas práticas a seus interesses. A desigualdade entre as classes seria, portanto, resultante de um histórico processo de sobreposição entre as classes, possibilitando um distanciamento cada vez maior entre dominadores e dominados. Sendo assim, contra o desequilíbrio entre as classes, haveria então a necessidade de um projeto do proletariado que “visa antes de mais nada a igualdade social a ser alcançada pela abolição da divisão de classes” (SINGER, 1981, p. 23).

Embora utópico do ponto de vista de um projeto coletivo, o desejo de ascender de classe é o que move diariamente o povo brasileiro. Sobre isso Ribeiro (1995), entende ser  visível que o povo brasileiro “vive transladando de um território para outro em busca de melhores condições de vida e de ascensão social. É preciso viver num engenho, numa fazenda, num seringal, para sentir a profundidade da distância com que um patrão ou seu capataz trata os serviçais, no seu descaso pelo destino destes, como pessoas, sua inconsciência de que possam ter aspirações, seu desconhecimento de que estejam, eles também, investidos de uma dignidade humana” (RIBEIRO, 1995, p. 216). O mesmo autor reitera que alguém quando consegue ultrapassar as barreiras e ingressar em uma outra classe social consegue transmitir em uma ou duas gerações crescimento em estatura e embelezamento corporal, podendo inclusive ser confundido com o patriciado tradicional.  Ainda assim, segundo ele, é impossível não perceber o contraste em aglomerados de pessoas onde predomina um grupo social. “A multidão de uma praia de Copacabana e os moradores de uma favela ou subúrbio carioca ou mesmo o público em um comício de Natal ou em Campinas, como representação dessas camadas opostas, se configuram ao observador mais desavisado com humanidade distintas” (RIBEIRO, 1995, p. 212).

É certo que o problema da desigualdade em poucos momentos foi encarado como meta a ser superada. Foi assim que historicamente a população negra sempre carregou o peso da herança marginal da dominação e escravização.

Fernandes (1975) parte de uma discussão histórica sobre o resultado do poder econômico da sociedade capitalista constituído de processos específicos de exploração de trabalho. Citando o “milagre econômico” ocorrido dentro do contexto do regime militar, o autor entende que este foi resultado da ex- propriação dos trabalhadores, obrigados a vender sua força de trabalho como única alternativa, sendo assim o crescimento econômico, portanto, não viria de graça, mas seria produto da exploração sitemática do trabalhador.

Por fim, esse debate sobre a estratificação social, nos faz refletir sobre a histórica desigualdade brasileira, construída à luz de um amplo processo de dominação e exploração. É inegável que tivemos  alguma mudança estrutural após o “fim” do modelo escravista, porém grande parte das atividades consideradas indignas para classes mais favorecidas continuaram a ser executadas por herdeiros de famílias outrora escravizadas, que por não conseguirem acesso à educação de qualidade, moradia digna, entre outros direitos,  são obrigadas a viver em condições de pobreza e miserabilidade.

É visível que nos últimos anos tivemos importantíssima redução dessa desigualdade social brasileira[1], graças à investimentos em políticas públicas importantes,  a exemplo de programas sociais de inclusão e transferência de renda sobretudo a partir dos Governos Lula e Dilma. No entanto, essas expectativas de mobilidade social, contrastam com as limitações e condições de subdesenvolvimento, próprias de uma economia dependente, portanto à margem do capitalismo global. Em um momento que as políticas econômicas adotadas pelo governo Lula 3 nos recolocam em condição de protagonismo entre os melhores PIBs mundiais, reconhecer nossos desafios é condição necessária para darmos novos passos rumo a construção de um país mais justo!!


REFERÊNCIAS:

FERNANDES, Florestan. “A Sociedade de Classes sob o Capitalismo Dependente” (apenas parte do capítulo, p. 48-69) in: Sociedade de Classes e Subdesenvolvimento. Rio de Janeiro: Zahar Editores, 1975, 3ª. edição. 

SINGER, Paul. Dominação e Desigualdade: Estrutura de classes e repartição da renda no Brasil (p.17-23, 101-120). Rio de Janeiro: Paz & Terra, 1981. 

RIBEIRO, Darcy. O Povo Brasileiro: formação e sentido do Brasil (p. 208-227, capítulo III.3, Classe, cor e preconceito). São Paulo: Companhia das Letras, 1995. 

SOUZA, Jessé. A Ralé Brasileira: quem é e como vive. Belo Horizonte: Editora UFMG, 2009.


[1] Dados recentes do IBGE, apontam que entre 2022 e 2023  8,7 milhões de brasileiros saíram da linha da pobreza. Essa situação, no entanto ainda atinge 59 milhões. Desses, 9,5 milhões ainda vivem em situação de extrema pobreza.


Nota do Blog. Este artigo, gentil e fraternalmente cedido, é uma contribuição do professor da Seduc-PA Antônio Marcos Ferreira; esse autor/professor integra a AIL, conforme já citado, e as Academias de Letras: Paraense de Cordel, Miriense de Literatura de Cordel, além de outras organizações de perfil literário, artístico e acadêmico. Ferreira foi co-fundador e primeiro Presidente do COMCIM, Conselho Municipal de Cultura, Desporto e Lazer de Igarapé-Miri (PA). Desde março de 2024, está vereador no parlamento de sua cidade.

sexta-feira, 20 de dezembro de 2024

Profs Israel Araújo e Rosimeire Meireles coordenarão o Sintepp, em Igarapé-Miri (#926)

Em Igarapé-Miri (PA) o Sintepp - Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras em Educação Pública do Pará terá nova Coordenação de Subsede, a partir de 01 de janeiro. Subsede é a organização que esse sindicato assume, no âmbito de cada município. Após findo o processo eleitoral no qual duas Chapas concorreram (leia matéria, clicando Aqui), a Comissão Eleitoral chamou ambas as chapas para fazer as escolhas de cargos, conforme os percentuais obtidos por cada chapa e definição de um quociente de cada uma. Assim sendo, a então Chapa 1 ficou com 13 cargos efetivos e 5 suplentes e a Chapa 2 com 11 efetivos e 3 suplentes.

O Estatuto do Sintepp exige que a chapa que alcançar o mínimo de 10% dos votos dentre os válidos tenha espaço na Coordenação, pois a ideia ou pressuposto é de que não há uma exclusão de "perdedores/as". Ao contrário, a democracia interna chama de proporcionalidade qualificada para esse processo em que, com base nos votos válidos recebidos por cada chapa, aplicando-se uma matemática e uma operação exata, é possível definir o quociente da chapa e, por processo de divisão, se chegar às ordens das pedidas; tudo isso com base no total de cargos em disputa, tanto para titulares quanto para suplentes (estatutariamente, o Sintepp determina que a Coordenação da Subsede tenha 1/3 de membros Suplentes, eleitos no mesmo pleito).

Em razão de tais regras, aqui muito sinteticamente apresentadas, e após as organizações internas de cada chapa, o professor e doutor Israel Fonseca Araújo volta a coordenar o sindicato, agora pela terceira vez, após ter saído da Coordenação-geral em maio de 2019 (para cursar Doutorado); antes, ele esteve na Coordenação entre junho 2015 e maio 2019. Já a professora Rosimeire Meireles Trindade assumirá a Coordenação-Geral pela primeira vez, sendo que a mesma ainda está, até 31 deste mês, na Coordenação da Secretaria de Assuntos Jurídicos, desde meados de 2021. O Sintepp não tem a figura de "vice": ambos os Coordenadores-Gerais têm legitimidade e representatividade legal e política para atuar. Além da Coordenação-Geral, o sindicato tem coordenações de Secretarias, sendo para este novo mandato um total de 11 (onze); nelas, também não há espécie de "vice". Há, ainda, um Conselho Fiscal, formado por 06 integrantes, cujo papel é, obviamente, de fiscalização.

Como fica a Nova Coordenação do Sintepp (2025, 26 e 27): 24 cargos efetivos

Coordenação-Geral: Israel Fonseca Araújo e Rosimeire Meireles Trindade

Coordenação de Secretaria-Geral: Maria Consolita dos Santos Carvalho e Elieth da Conceição Miranda Serrão

Coordenação de Secretaria de Finanças: Walfredo Júnior Castro da Silva e Alcinete do Socorro Sousa e Silva

Coordenação de Secretaria de Formação: Ruth Helena de Castro Barbosa Mendes e José Moraes Quaresma

Coordenação de Secretaria de Assuntos Jurídicos: Graciete Pantoja Antunes e Marcelo Quaresma Pureza

Coordenação de Secretaria de Previdência, Aposentadas e Aposentados: Caridade Afonso da Silva e Raimunda Pureza Costa

Coordenação de Secretaria de Eventos Culturais e de Lazer: Manoel de Jesus da Trindade Sampaio e Carlos do Socorro Serrão Oliveira

Coordenação de Secretaria de Funcionárias e Funcionários: Rosilda Maria Lobato Ribeiro e Maria do Carmo Barbosa de Lima

Coordenação de Secretaria de Comunicação: Renato José Gonçalves dos Santos e José Maria Nazareno de Castro Pantoja

Coordenação de Secretaria de Educação do Campo: Dionéia Quaresma Rodrigues e Rosilda dos Santos

Coordenação de Secretaria de Educação Inclusiva: Aldacy Gonçalves da Silva e Maria Ilza Almeida Vilhena

Coordenação de Secretaria de Saúde da Trabalhadora e do Trabalhador em Educação: Adalmir Silva da Conceição e Maria Agostinha Paiva Ladislau

 Suplentes da Coordenação (08 cargos)

      Edilza do Socorro dos Santos

     Katiane Cabral Marinho

     Eleson Silva da Silva

    Maria Lucidelma Lima de Castro

    Márcia Martins Corrêa

    Sônia Maria Corrêa do Amaral

   Maria de Fátima dos Santos Cardoso

   Telma do Socorro dos Santos

 

Conselho Fiscal:

Titulares: Agnaldo Nascimento Ferreira, Leonilde Pinheiro de Sousa e Odivaldo Mendes de Moraes

Suplentes: Agenor Nascimento Ferreira, Josenildo Cosme Moraes Quaresma e Rosinaldo Pina Oliveira

domingo, 15 de dezembro de 2024

Armas com "balas" de gel: brinquedo ou treinos para matar? (#925)

Armas "de gel" trazem enorme preocupação, Brasil a fora. Igarapé-Mir (PA) já está em alerta diante de uma nova "modinha" que se tornou recente febre e clima de tensão, sobretudo pelas cidades e áreas periféricas do país. Não há grande consenso, por ex, entre educadores e professores(as), mas, conforme verificações deste Blog em redes sociais, o que se percebe é que há predominância em uma compreensão de que tais armas (ou simulacros de armas letais) produzem preocupação social e alertam as camadas populacionais para diversos riscos que daí podem advir.

Por exemplo: ferimento de olhos em pessoas que transitam pelas ruas; danos em veículos de terceiros, sobretudo carros; ferimentos nos(nas) próprios jovens que praticam os disparos (nas correrias, a pé, ou usando motos de modo imprudente, acidentes diversos podem acontecer); aumento da percepção de violência urbana e, consequentemente, afetação no psicológico de pessoas diversas, dentre outras consequências.

Historiador e professor, Especialista em Investigação Criminal e Psicologia Forense (UnB), Elvis Nunes Corrêa destaca, nas redes sociais: "o engraçado é os órgãos competentes já terem se pronunciado afirmando que não é classificado como brinquedo (INMETRO), mas ainda tem gente desinformada difundindo a falsa informação de que se trata de um brinquedo". Em outras palavras, não é por falta de conhecimentos que a população está sendo levada a achar que se trataria de "brinquedos", de brincadeiras. Outro destaque que fazemos é da professora Rosa Pantoja, também em grupo de compartilhamentos de mensagens: “eu encontrei, agora há pouco, um menino que aparentemente tem uns 13 anos, em uma bicicleta com uma arma dessas e ele apontava pra todos os lados, inclusive pra mim, simulando estar atirando e o olhar dele era assustador” (grifo deste Blog).

A título de exemplo, veja-se matéria da TV Brasil "Armas que disparam bolinhas de gel se tornam um risco sem legislação específica" (para acessar, clique aqui); sob a forma de comentário na publicação, internauta destaca que "o art. 26 do Estatuto do Desarmamento veda a fabricação, venda, comercialização e importação de brinquedos, réplicas e simulacros de armas de fogo...". Eis a citação, in verbis:

Lei Nº 10.826, Estatuto do Desarmamento, de 22 de dezembro de 2003

Art. 26. São vedadas a fabricação, a venda, a comercialização e a importação de brinquedos, réplicas e simulacros de armas de fogo, que com estas se possam confundirParágrafo único. Excetuam-se da proibição as réplicas e os simulacros destinados à instrução, ao adestramento, ou à coleção de usuário autorizado, nas condições fixadas pelo Comando do Exército.

Já em outubro deste ano, a situação ganhou espaço no maior programa semanal da televisão brasileira - o Fantástico (TV Globo):

Febre nas periferias, armas de gel não são consideradas brinquedos e podem ser perigosas, diz especialista

Armas de plástico, com munição feita de gel, estão se popularizando entre crianças e adolescentes, mas podem cegar se atingirem os olhos e são produtos destinados a adultos, segundo Marcelo Monteiro, do InmetroPor Fantástico, 13/10/2024 21h09 (acessar o conteúdo, clicando AQUI)

Brasil afora, o número de pessoas atendidas, sobretudo por ferimentos nos olhos é muito grande e vem preocupando autoridades e demais pessoas. Decretos e normas legais várias também já têm sido criadas, pois o espaço público está sendo atacado, violentado com essas práticas; ou seja, o predomínio do coletivo sobre o individual está sendo prejudicado. Por isso, o poder de polícia que é discricionário de prefeitos e prefeitas está sendo ativado, nessa temática.

Embora sejam plenamente possíveis e aceitáveis discussões sociológicas na esteira dos direitos da juventude de brincar, divertir-se e usufruir dos espaços públicos (plurais, multissemióticos, polivalentes), não há que se afastar a ideia de que as representações mentais, sobretudo juvenis, podem ser negativamente atingidas por essas práticas; para quem tem visto os corre corre que os praticantes dessa "diversão" fazem pelas ruas, é perceptível que o acontecimento é assustador e simula ações criminosas. É como se, em Igarapé-Miri, estivéssemos vendo os tempos de brigas com "cospe-chumbo", momento em que pessoas se atiravam pelos bairros e em circunstâncias de rivalidades diversas. Os resultados, ou o pós tais acontecimentos, bem sabemos quais são.