(Wladimir Herzog)
Dias
depois [de setembro de 1975], a emissora transmitiu um documentário sobre o
chefe vietnamita Ho Chi Minh. A primeira reação não veio da censura oficial do
regime, mas dos “cães de guarda” da imprensa(...).
Embora informado de que passa a passa a fazer parte de uma lista de
suspeitos, Herzog continuou sua vida regular. No dia 24 de outubro, foram à
emissora para prendê-lo. Pediu tempo para concluir um telejornal e se
prontificou a comparecer ao Departamento de Operações de Informações – Centro de
Operações de Defesa Interna (DOI-CODI) na manhã seguinte. E assim efetivamente
procedeu para, segundo pensava, prestar esclarecimentos. Conforme registra
Gaspari (2004, p. 174), “foi acareado com dois colegas. Negou que pertencesse ao
PCB e ficou a sós com um interrogador em uma sala do andar térreo. Os dois
colegas, em um corredor contíguo, ouviram seus gritos e a ordem para que fosse
trazida a máquina de choques elétricos. Um rádio, em volume alto, abafava os
sons. A certa altura, o noticiário informou que o generalíssimo Francisco
Franco, Ditador da Espanha desde 1936, recebera a extrema-unção... No meio da
tarde fez-se um grande silêncio na carceragem”.
Vlado, apelido pelo qual o jornalista era conhecido, estava moto.
Segundo a Agência Oficial do Serviço Nacional de Informação (SNI), cometera
suicídio. “Era o 38º suicida, o 18º a enforcar-se, dessa vez com uma ‘tira de
pano’”, anota Gaspari (2004, p. 174). E prossegue, em um trecho que, em suas
grandes linhas, poderia ter sido escrito por Foucault: “Horas depois da
confirmação de sua morte, começou um daqueles processos em que reações individuais
e desarticuladas desembocam em comportamentos que, sem coordenação ou
planejamento, constroem os grandes fatos históricos(...). O medo era tanto que
foi desafiado” (Gaspari, 2004, p. 176).
Na segunda-feira, 27 de outubro [de 1975], após o funeral do Vlado,
irrompe uma greve na USP. Foucault suspende seu curso. Anos depois, descreverá os
acontecimentos de 31 de outubro, nas exéquias de Herzog, às quais esteve
presente(...).
Fonte: Heliana de Barros Conde
Rodrigues. Ensaios sobre Michel
Foucault no Brasil: presença, efeitos, ressonâncias. Rio de Janeiro:
Lamparina editora, 2016.
OBS.: Helio Gaspari. A ditadura encurralada. São Paulo: Companhia das
Letras, 2004.
P.S.:
Brasil é condenado por não
investigar assassinato e tortura de Vladimir Herzog
Corte Interamericana de Direitos
Humanos determinou que o Estado brasileiro apure, julgue e, se for o caso, puna
os responsáveis pela morte do jornalista na ditadura militar
A Corte Interamericana de
Direitos Humanos (CIDH)condenou nesta quarta-feira o Estado
brasileiro pela falta de investigação, julgamento e punição aos responsáveis
pela tortura e assassinato do jornalista Vladimir Herzog,
ocorrido em 1975. O tribunal internacional também considerou o Estado como
responsável pela violação ao direito à verdade e à integridade pessoal, em
prejuízo dos familiares de Herzog.
“A CIDH determinou que
os fatos ocorridos contra Vladimir Herzog devem ser considerados como um crime
de lesa-humanidade, conforme definido pelo direito internacional”, diz a sentença.
Em 24 de
outubro de 1975, Vladimir Herzog, então com 38 anos, funcionário da TV Cultura
de São Paulo, apresentou-se voluntariamente para depor às autoridades militares
no DOI/CODI, em
São Paulo. Entretanto,
foi privado de sua liberdade, interrogado, torturado e finalmente assassinado,
em um contexto sistemático e generalizado de ataques contra a população civil
considerada como “opositora” da ditadura brasileira,
e em particular contra jornalistas e membros do Partido Comunista Brasileiro,
segundo a ação.
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