Presidente da Academia Igarapemiriense de Letras (AIL)
Cadeira n. 07 - Manoel Luiz F. Fonseca
(Reprodução da capa do JM, dez. 2015)
Nas últimas semanas, Igarapé-Miri foi informado de que o Jornal Miriense (JM), sucessor do Jornal Mensageiro do Miri, fundado em 01 de janeiro de 1980 (isso, mesmo; 1980), iria colocar nas ruas a sua "última edição". Que encerraria suas atividades, de acordo com postagem de rede social, de seu Editor-chefe e Fundador, Dorival Pereira Galvão. O próprio Galvão já havia confidenciado que as dificuldades para manter um periódico mensal, em uma cidade pequena como a nossa e pouco acostumada à leitura de jornais, de uma certa maneira (acrescento). E tal se fez cumprir, com a chegada às ruas da edição especial de número 200.
O jornal traz uma chamada de capa que anuncia: "Encerra-se aqui a longa história do jornal mais lido do Baixo Tocantins", além de notícias sobre a administração municipal, casos de violência urbana, a denúncia do Sintepp local (no Ministério Público Estadual), entre outros temas. Acostumados à leitura do JM, uma boa parcela do povo igarapemiriense saiu à busca da edição especial, já anunciada, e se deparou com a informação estampada ("ÚLTIMA EDIÇÃO"). Dorival Galvão sempre confidenciava, entre chegados, que a última edição sairia depois de seu falecimento...
Acontece que a saída de cena do JM lança sobre Igarapé-Miri algumas indagações sobre a presença da mídia jornalística produzida e feita circular nestas terras: a) quais jornais conseguirão manter uma estrada tão longa ou que ao menos se aproxima da trilhada pelo JM?; b) os jornais A Folha de Maiauatá e jornal Sementes, que circularam por uns anos e pararam: será possível o Tribuna Popular ou outro periódico seguir essa estrada, ainda mais em tempos de produtivas mídias virtuais ("alternativas")?; mais que isso: c) em tempos de Blogs, páginas de relacionamento e grupos de WhatsApp, os jornais impressos terão condições de continuar a conquistar leitores(as), em Igarapé-Miri?
Sem respostas ou com sugestões de respostas, o certo (se posso falar de "verdade", aqui) é que a saída de cena do JM deixará uma lacuna (foram 35 anos de atividades) e um bom desafio a quem queira trilhar essa estrada, em Igarapé-Miri.
Na UFPA, Jornal Miriense foi tema de uma pesquisa de Mestrado
Este mesmo professor, quando de sua proposta de pesquisa para o Mestrado em Letras no PPGL (Programa de Pós-Graduação em Letras), pautou o JM como corpus de análise, em razão da cobertura da ação política da mulher na sociedade igarapemiriense, sobretudo nos anos 2004 até fins de 2008 (períodos de campanhas à Prefeitura de Igarapé-Miri, com uma mulher sendo eleita em 2004 (Dilza Maria Pantoja Corrêa), governando entre 2005 e 2008 e sendo novamente candidata, em 2008; desta vez derrotada). O recorte da pesquisa levou em conta essa maior efervescência de publicações que tematizavam a mulher que atua(va) na política de Igarapé-Miri, em razão da estrada jornalística trilhada pelo JM e em razão de o fazer jornalístico ser visto, na pesquisa, como uma prática discursiva. Assim, o Miriense foi entendido como "um veículo da mídia impressa, de abrangência
local, apesar de circular esparsamente em outros municípios além de
Igarapé-Miri. Neste texto, esse veículo é chamado de Jornal Miriense, Miriense
ou JM. Para além da função
de informar a população e publicar a ocorrência de fatos de interesse social, o
Miriense ajuda a instituir uma realidade por meio de sua ação discursiva" (ARAÚJO, 2015). Israel Araújo cursou Mestrado em Letras, na UFPA, entre os anos de (março de) 2013 e junho de 2015.
Entre os principais objetivos do estudo, estava investigar as relações interdiscursivas que constituem esse exercício enunciativo jornalístico. Intitulada "A enunciação da ação política feminina em Igarapé-Miri:
um estudo das relações interdiscursivas no Jornal Miriense", a pesquisa foi orientada pela Dra. Fátima Pessoa (PPGL-ILC) e recortou mais de oitenta textos do JM para análise, sob a ótica da Análise do Discurso de linha francesa (AD), entre outros procedimentos teórico-metodológicos. Dois principais grupos de textos foram recortados; (i) os que tratavam da ação da mulher que atua em diversas funções; (ii) os que tratavam da ação específica da prefeita de Igarapé-Miri, redivididos entre os que faziam referências positivas a seu trabalho e os que o combatiam.
Entre os resultados a apontar, podem ser citadas as relações entre discursos do JM que enalteciam a figura da mulher e/ou da prefeita e os que combatiam (inclusive sob recurso à figura da ironia) a citada atuação política. A presença da religiosidade cristã trazida à cena enunciativa também foi fartamente constatada, além da veiculação de estereótipos atinentes à relação da mulher com o campo do trabalho, na medida em que, à mulher com atuação pública em Igarapé-Miri, o JM convocou reiteradamente a presença do magistério (atuação como professora ou ex-professora); o recurso às sugestões sobre um perfil de corpo feminino, vinculado à imagem da gestora e posto à distância de parâmetros como o da boneca "Barbie" ou da Xuxa Meneguel, também foi bem explorado discursivamente, pois o veículo. A prefeita, sendo mulher e tendo seu trabalho combatido, ao ser apresentada nas publicações, parecia criar maior efeito de sentido quando das provocações sobre sua aparência e sugestão de desalinhamento a padrões de beleza... do que no que se refere a uma atuação de governante, de administradora de um município. Para falar de algumas questões, apenas.
A seguir, o Resumo da Dissertação(*) apresentada à Banca de Defesa, no dia 25/06/2015:
A
presente dissertação discute a maneira adotada pelo Jornal Miriense (JM) para
apresentar a seus leitores a mulher que tem atuação pública/política no
município de Igarapé-Miri (PA), seja no que concerne à análise de uma cobertura
jornalística mais voltada para a própria personalidade política, seja no que
concerne ao exame de uma enunciação que se volta para a divulgação de ações
políticas mais específicas, tais como a atuação em movimentos sociais e na
prefeitura de Igarapé-Miri. Investiga-se o funcionamento discursivo do fazer
jornalístico que se materializa no Jornal Miriense, veículo produzido no
município de Igarapé-Miri há 35 anos, especificamente no conjunto de
publicações veiculadas entre os anos de 2004 a 2008. Foram constituídos quatro
grupos de textos, definidos como G1, G2, G3 e G4, os quais apresentam a atuação
feminina em diversas funções públicas/políticas (G1 e G2) e na função
específica de prefeita de Igarapé-Miri (G3 e G4). Nas publicações, buscou-se
atentar para as articulações entre o fazer jornalístico e a vida pública/política
em Igarapé-Miri, bem como entre discursos sobre o lugar social da mulher e a
dimensão de gênero que pode impactar o modo de se dizer, midiaticamente, acerca
da aparição pública/política feminina no JM. De que maneira essas articulações geram
sentidos nas publicações analisadas é uma indagação que define concretamente o
horizonte principal postulado para a pesquisa: investigar as relações
interdiscursivas constituintes do Jornal Miriense, materializadas nos textos que
tematizam a ação pública/política feminina, em Igarapé-Miri. A investigação se
baseia em postulados da Análise do Discurso da linha francesa (AD),
especificamente com base no modelo defendido por Dominique Maingueneau (1997,
2008, 2011), adotando-se as seguintes ferramentas teóricas e analíticas:
interdiscurso, prática discursiva, cena de enunciação e dêixis discursiva. Acredita-se
que a enunciação jornalística do JM expõe relações interdiscursivas convocadas
nos textos para se referir à figura política tematizada, estabelecidas por um
conjunto de cenas enunciativas, que se sustentam em elementos da dêixis
discursiva adotada. Nessa interface, ganha vital relevância a imbricação entre
mídia e discurso, razão pela qual a pesquisa ancora-se em postulados de autores
como Gregolin (2007), Lage (2005), Melo (1994) e Miguel (2002, 2003a). Foi
possível constatar um conjunto de relações interdiscursivas que apontam para a
articulação entre o discurso jornalístico do JM com a prática religiosa em
curso em Igarapé-Miri, bem como entre essa prática jornalística e a prática
política que ajuda a constituir a vida pública municipal, assim como entre a
prática discursiva jornalística e a dimensão de gênero, a qual impacta
significativamente o funcionamento discursivo do JM ao enunciar sobre a mulher
com atuação pública/política em Igarapé-Miri.
Palavras-Chave:
prática discursiva jornalística; relações interdiscursivas; gênero; política;
Igarapé-Miri; Jornal Miriense.
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(*) A Dissertação foi aprovada sob inúmeros elogios e apresentação de sugestões para melhoria, com conceito final "Aprovada com indicação à publicação".
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