sábado, 5 de fevereiro de 2022

Sargento da Marinha: Sobre a execução do negro Durval Filho, com 3 tiros de pistola e à queima-roupa

Israel F. Araújo (editor, fundador). Contato: poemeiro@hotmail.com

Academia Igarapemiriense de Letras (AIL)


Durval Filho; img Rede Globo: disponibilizada por Carta Capital


Este relato é profundamente triste e pode te causar mal-estar, sofrimento íntimo e angústia. Quer continuar? Então, te prepara. Aconteceu assim, e se deu, novamente, no Rio de Janeiro (BR), desta feita em São Gonçalo:

 

I - Um homem branco, sargento da Marinha (Sr. Aurélio Alves Bezerra) – ou seja, integrantes das Forças Armadas (formadas por servidores públicos que dispõem de armas de fogo para andar, trabalhar, se locomover, passear, ir a lanchonetes, aniversários, casamentos, sorveterias, festas, bares...), avistou um cidadão negro (Durval Teófilo Filho, um homem negro, que o Sargento da Marinha possivelmente não reconheceu e que não era de seu grupo de amigos, por ser negro ou por outra razão) que chegava próximo a sua pessoa (do Sargento). Imediatamente, este sacou de sua pistola e deu um tiro em Durval (o homem negro, que morava no mesmo condomínio “do” Sargento); Durval caiu, espécie de mão levantada, clamando por socorro e suplicando para não ser mais atirado, para não ser morto. O Sargento, vendo isso, deu mais dois tiros à queima-roupa em Durval (o homem negro, seu vizinho de condomínio), finalizando, dessa forma, a vida de Durval Filho (o homem negro...). O racismo estrutural, neste país, propicia que pessoas moradores de apartamentos ou ruas próximas não "se conheçam", nem conversem, de modo que o cidadão - ou a cidadã - branco nem conheça seus vizinhos; digamos assim: seus vizinhos pretos são invisíveis.


II – Ato contínuo, o Sargento se aproximou e constatou que Durval (o homem negro, seu vizinho de condomínio) não portava arma, que não iria lhe atirar, assaltar e/ou matar: a tese do Sargento branco era de que Durval (o homem negro, possivelmente somente por ser negro) estava mexendo próximo da cintura e que poderia cometer assalto. Antes de atuar como militar, de exigir "mãos ao alto" etc., o que fez o Sargento/branco? Fuzilou o descendente africano: depois, se pergunta se era assalto ou se não era (mas Durval, o negro, não teve meios de dizer que não era, pois morto não fala). Nesse momento, já era a vida de mais um negro, assassinado covardemente neste Brasil, com os requintes de animalidades de que se revestem esses crimes sobretudo no Rio de Janeiro (lembram da recente execução do jovem congolês, que fugiu de lá para não ser morto...?). O Rio de Janeiro é exemplo de Brasil, tbm nesse aspecto: lembram da execução de um músico negro, com cerca de 80 tiros contra seu carro, sua pessoa?


II - Com a obrigação de fazer investigação (tem imagens de câmera e outras provas), a Polícia saiu a campo. Tudo anotado e "tecnicamente" documentado, o que fez o delegado (que é integrante de força armada)? Registrou, ofertou relatório dizendo que houve "homicídio culposo", pois o Sargento branco deu 3 balaços no Durval (negro) "sem intenção de matar" Durval; isso, mesmo. Digamos assim: esses tiros à queima-roupa se prestavam a fazer cócegas em Durval !!! (contém ironias, tá?).

 

III - Felizmente, o Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (que é obrigado a atuar, nesses e em outros casos) saiu em defesa da memória de Durval (lembremos que, vida, ele não tinha mais). Assim sendo, segundo informa a Carta Capital, o “MP-RJ diz que sargento da Marinha que matou vizinho por ‘confundi-lo com ladrão’ cometeu homicídio doloso” (consulte a matéria, na íntegra, clicando Aqui). Segundo a mesma matéria, Sargento seguirá preso: "A Justiça determinou a manutenção da prisão do Sargento da Marinha Aurélio Alves Bezerra, que atirou e matou o seu vizinho de condomínio Durval Teófilo Filho, em São Gonçalo, no Rio de Janeiro.[...] O militar também pode passar a responder por homicídio doloso (em que há a intenção de matar). O Ministério Público do Rio de Janeiro pediu a mudança da tipificação do crime à juíza Ariadne Villela Lopes, da 5ª Vara Criminal".


IV - Agora, resta lutar, esperar, denunciar e até torcer. Enquanto escrevemos este pequeno texto, mais negro são executado, feito "bichos", país afora. Por que um delegado (servidor público estadual) faz esse escárnio contra a memória do Durval (negro) Filho? Possivelmente, por estratégia política de manutenção do racismo estrutural; ou por coisa pior, já que se fosse julgado por crime "sem intenção" de matar, o Sargento Aurélio pegaria uma pena menor; sairia mais rapidamente de uma possível cadeia. Ainda bem, o MPE/RJ está acordado.


V - Sabemos que uma parte de nossa sociedade está apoiando o executor (o assassino), mas este Blog está pensando na vida perdida fria e covardemente, na família de Durval, em sua dignidade assassinada e no que isso significa historicamente e contemporaneamente, neste Brasil. Estamos dizendo, aqui traduzindo: que o "bandido" é o assassino; não é quem tem mais melanina na pele.

3 comentários:

  1. Pois é, professor, esta é uma das consequências do uso de armas de forma irresponsável.
    Principalmente nestas circunstâncias, "um cidadão de bem", frente a homem negro. Primeiro atira e depois verifica se o mesmo estaria armado ou não ou, o que é pior, se tinha ou não alguma atitude hostil naquele momento.

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  2. Professor sem palavras para um fato absurdo desse lamentável

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  3. Um racismo estrutural escancarado, que se repete, que ecoa um som de morte direcionado. Esse corpo não importa? É um corpo outro? É Necropolitica.

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