domingo, 31 de maio de 2020

Jerê Santos, via Facebook: policial branco assassina homem negro George Floyd (EUA) - "nosso" texto de domingo

Israel Araújo (editor, fundador; e-mail: poemeiro@hotmail.com)
Academia Igarapemiriense de Letras (AIL)




Neste domingo, derradeiro dia de maio/2020, em meio ao caos instalado no Brasil - por Jair Bolsonaro (ex-PSL, ex-PP, ex-outros muitos partidos) e pela pandemia de Covid-19 - eu estava pensando sobre as execuções de negros, geralmente pobres e favelados e/ou de bairros ou territórios específicos - o que, via de regra, articula racismo, xenofobia, misoginia, pobreza, ódio de classe, política de estado deliberadamente de morte e outros elementos. Não irei tratar deles, inclusive porque me falta "autoridade" intelectual para tal.
Essas execuções sumárias (praticadas pela polícia legal (estatal), pelas "polícias" ilegais (por ex, as milícias e escritórios do Crime, Brasil afora) e por agentes diversos de segurança - de redes de supermercados, p. ex.) são símbolo de que o racismo, acima de tudo ele, continua a ser profundamente forte - estrutural - nas sociedades (pós-)modernas. Brasil e Estados Unidos da América (EUA) são exemplos dessas práticas de execução. Execuções em Paraisópolis (SP), nas favelas do Rio de Janeiro e pelo país afora comprovam esta leitura; basta estudar estudos sérios, pesquisas brasileiras e internacionais sobre a questão. Assim se executa jovens e homens negros com frequência nos EUA, o Brasil tbm copia, em lastimável entreguismo intelectual e ideológico de parte de nossa população. Para refrescar a memória: apenas a polícia carioca (RJ) pode matar, em um ano, cinco vezes mais pessoas do que a polícia dos EUA, no país inteiro.
O cantor e compositor Gabriel, O Pensador, em certa música, falava (eu-lírico da canção, digamos) de um país de "malucos suicidas e imbecis que adoram guerra...": "O mais hipócrita da terra / Malucos suicidas e imbecis que adoram guerra Misturados num lugar cheio de farsa e preconceito Me diz porque essa merda de bandeira no seu peito?" (música: Filho da pátria iludido): boa síntese, não?
O Brasil "de Bolsonaro" segue copiando grande parte dessas loucuras e desses adoecimentos (de tecidos) sociais.
Por felicidade, encontrei o seguinte texto (no Facebook), de excelente qualidade, e que expressa / problematiza melhor a questão que eu queria tratar neste texto do domingo. Seu autor é Jeremias Santos, estudante igarapemiriense, mestrando no PPGEDUC (Ufpa-Cametá). Segue o texto de Jerê



O assassinato do homem negro George Floyd por um policial branco desencadeou várias revoltas e protestos contra a violência policial em Minneapolis (EUA). Protestos contundentes da maneira mais direta possível, ao ponto que a delegacia foi incendiada. As imagens desses eventos fez muitas pessoas perguntarem por que não acontece o mesmo no Brasil, uma vez que pessoas negras morrem por violência policial todo dia aqui. É uma questão a se pensar, que possui um percurso histórico.
A colonização inglesa nos EUA utilizava o racismo de maneira explícita para segregar a população negra. A diferenciação explícita de negros e brancos, o não estímulo a mestiçagem e a periferialização da população negra para os "guetos" estabeleceram nítidas fronteiras raciais naquele país. Existe uma demarcação muito expressa de bairros de brancos e bairros de negros, por exemplo. O apartheid norte-americano, apesar de não ser tão comentado quando o sul-africano, utilizou dos mesmos métodos.
Assim, a população negra norte-americana criou um senso de comunidade muito forte. A história os mostrou o quanto a identificação racial e a luta contra o racismo é importante para todos os negros. Esse senso de comunidade atravessa em vários níveis da sociedade. E quando uma pessoa negra é atingida pelo racismo, as outras pessoas negras se sentem atingidas também, e revoltam-se.
Já no Brasil, a história possui diferenças importantes. A colonização portuguesa utilizava uma política de assimilação, o tal "melhoramento racial" que é a política de branqueamento da sociedade. Combinado com o estupro, isso resultou numa população essencialmente negra e mestiça. Após a abolição, o Brasil não procurou resolver seus problemas com o racismo, negando-o e empurrando a sujeira pra baixo do tapete. A escravidão é relativizada e as pessoas negras não estudam sua própria história nas escolas do estado branco.
Dessa maneira, a população brasileira tem problemas mal resolvidos com a sua história de convivência com o racismo. Quando uma pessoa negra é assassinada por racismo, isso é relativizado, não causa uma revolta generalizada que culmine da mesma maneira que nos EUA. Aqui, a anestesia garantiu uma amnésia que as pessoas vêem a morte dos negros como algo distante, eventos isolados. A própria população negra não possui um senso de comunidade forte entre si que possibilite organização ampla.
Somado a isso, mesmo a população negra mais engajada nesse sentido ainda se sente confusa. Criam critérios pequenos para lidar com a violência estrutural do estado, formando assim pequenas bolhas de militância, falando um código acadêmico pouco acessível para a maioria da população negra do país. Somando isso a histórica negação do racismo e o mito da "democracia racial", é possível compreender por que o racismo é tão naturalizado no Brasil. Ele convive nas sutilezas do cotidiano, se esgueirando pelas brechas e silêncios da sociedade. E, não raro, atira uma bala em um corpo negro.
Em outras palavras, a relação da população negra com o genocídio negro tem sido uma relação de distância, uma vez que a mesma não tem ideia da dimensão desse genocídio, e de proximidade, já que ela é a vítima.
Para que a gente consiga organização ampla contra o racismo no Brasil, precisamos avançar no reconhecimento da identidade negra e sua aceitação, no ensino de história e cultura afro-brasileira e africana e na ampliação desses debates para todos os negros, não só a universidade ou a internet.
Se a população negra não souber o que é racismo e como este lhe afeta, não se revoltará contra ele de maneira contundente.

(FIM)

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